Toda vez que vejo uma mulher muito bonita, eu me lembro da criança que eu fui, sempre atenta às qualidades dos outros, sem ver grandes atributos em mim. Eu precisava de um cirurgião plástico. De um ortodontista. Ou de um milagre. Ou precisava fazer a única coisa que dependia apenas de mim: aprender a gostar de mim do jeito que vim ao mundo. Escolhi esse segundo caminho, o único sobre o qual eu tinha certo controle.
E a moda, generosa, deu um jeito de ocupar um lugar em minha vida como grande aliada, mesmo que por muito tempo eu apenas me culpasse por isso. Eu podia ter uma tremenda sensação de bem estar dentro de uma roupa bonita, mas logo isso se transformava em culpa, porque assim me ensinaram. (Apesar de sermos obrigados a cobrir o nosso corpo com alguma coisa todos os dias, insistimos em dizer que vestir-se é assunto sem importância. E durma com um barulho desses.)
O raciocínio ainda é piorado pela forma como a moda é tratada pelas mídias em geral, inclusive pela maior parte dos blogs de moda: os discursos são rasos a tal ponto, que nos esquecemos que o vestir é uma manifestação cultural.
Como se não bastassem seus inimigos particulares, que atacam sua segurança a todo momento, você ainda tem que conviver com a culpa: já que roupa não traz felicidade, o que você está fazendo de novo dentro do provador?
Hoje, falo sobre moda e autoestima por experiência própria. O vestir foi parte da construção de um ser humano mais confortável em si mesmo e esse aprendizado merece ser passado para frente. Mas, como todo discurso reduzido a poucas palavras, a mensagem pode soar duvidosa. A desconfiança é compreensível. Vivemos num mundo em que os comerciais de TV nos sorriem soluções de vida, como se um eletrodoméstico pudesse de fato nos fazer mais felizes ou melhores. Não, uma peça de roupa não tem o poder de aumentar nossa felicidade. Mas tem o poder de nos oferecer um outro ponto de vista a respeito de nós mesmos.
Se a nudez é crua, o vestir é uma construção. Não podemos escolher ter as pernas grossas ou finas, mas podemos decidir o que nos vai cobrir (ou não) as pernas e, assim, construir com nossas preferências a nossa forma de estar no mundo. Um strip-tease pode revelar muito sobre o nosso corpo. Mas o ato de vestir pode falar muito mais sobre as nossas escolhas e a nossa alma.
Ilustração: Rogerio Fernandes - http://www.rogeriofernandes.com.br/
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